as botas

calcei hoje as botas. as minhas. pela primeira vez este ano esteve frio suficiente para elas. e, percebi há pouco, reuni a coragem necessária para calçar as minhas botas.
tenho outras, que são minhas, que eu escolhi, mas que nunca foram confortáveis o suficiente para serem realmente, as minhas botas.
tenho umas outras que me deram e que, apesar de confortáveis, têm as marcas de outros pés que, apesar de bastante familiares, não são os meus. portanto, não são verdadeiramente as minhas botas.
há outras, que também me deram, novas. ainda não são minhas e acho que não serão: não as escolhi. serão sempre as botas que x me ofereceu.
estas, as que trago agora, são minhas. só os meus pés as pisaram. estão todas escalavradas e não devem aguentar até ao fim do inverno, pensamento que me aflige.
a última vez que usei estas botas, a minha vida era tão completamente diferente do que é hoje, que tive medo de que quando as enfiasse já não fossem tão confortáveis como eram no último inverno. tive medo que, com todas as transformações que sofri, o corpo tivesse registado essas mudanças e fossem palpáveis o suficiente para que as botas e a sensação de conforto que elas me davam, se tivesse evaporado.
com alívio, percebi que afinal, encaixavam como luvas, se as houvesse para os pés. que o meu andar continua tão torto quanto era no inverno passado e que o facto de a sola de borracha estar completamente gasta do lado direito não é um desconforto, antes um extra para os meus pés que tanto sofrem com as horas em que conto com eles para aguentar os 130 quilos de carnes, bacon e problemas que carrego.
tudo para dizer que, afinal eu existo e sou a mesma desde o inverno passado. é que ainda que tudo mude por fora, que as paisagens se alterem, que o tempo se transforme, que mudem as caras com que me cruzo diariamente, que a minha rotina se altere de tal forma que eu durma até às  4 da tarde sem peso na consciência, há coisas que não mudam e com que posso contar sempre, nomeadamente o facto de os meus pés continuarem a gastar mais sola do lado direito que do esquerdo e que a borracha de pneu é a melhor cena da vida para fazer solas.

Comentários

  1. olha badamerda.... vais-me deixar a imaginar como são o raio das botas? foto, fachavor. ( se eu escrevesse sobre botas, escreveria parecido )

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. oh rafinha, não são nada de especial, só são minhas! ;-) e porque não escreves? tínhamos uma ashtag só nossa: #thesebootsaremadeforwalking

      Eliminar
    2. só com essa # convenceste-me. não sei se tenho assim tanto a dizer sobre botas... mas vou pensar :)

      Eliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

E o cante já é Património Cultural Imaterial da Humanidade!