2014
Em 2014 eu: servi copos num bar, dormi pouco, fiz espectáculos, escrevi um texto para teatro, vi a minha irmã emigrar, fiz candidaturas, ajudei a organizar e a levar a cabo um festival internacional de teatro. Conheci pessoas.Visitei amigos depois de anos a adiar e fui feliz. Fui actriz aos bocadinhos. Chorei qualquer coisinha. Não fui muito alegre. Não consegui levar a cabo o meu blogue novo nem matar o velho e escrevi pouco. Passei metade do ano de muletas, mas fiz uma ressonância magnética à la Dr. House. Não fiz análises. Tentei fazer dieta, resultou e depois desisti. Tirei mais fotografias, ouvi mais música. Separei-me. Mudei de casa e ajustei-me novamente ao silêncio. Procurei mais silêncio. Não tive férias na praia. Descobri que andar de muletas na areia é muito difícil. Fiz fisioterapia. E pus muito gelo no pé. Não viajei. Não passeei muito. Assisti a mais espectáculos de teatro porque ajudei a trazê-los à cidade onde vivo. Vi mais concertos porque ajudo a organizá-los. Vi uma candidatura aprovada. Depois de quase 20 anos longe da família, percebi o que custa estar realmente longe. Vi muita gente abalar. Gente demais. Revoltei-me e senti-me sufocada. Quis ajudar e não consegui. Juntei-me a um projecto de solidariedade social na expectativa de fazer alguma diferença. Pensei muitas vezes em mudar de vida, de trabalho, de cidade e resolvi ficar. Porque quero fazer diferença. Senti-me cansada, estoirada, injustiçada e fui injusta. Tive ataques de renite e muito frio. Não tive calor, porque estive em casa o verão todo. Fiz mais contas e orçamentos do que gostaria e passei o ano novamente sem um tostão. Partiram-me o coração, ou deixei que partissem ou eu mesma me encarreguei de o partir, mas tem-se vindo a remendar. Descobri o efeito melhoral de um amigo de sempre e como só pelo facto de perguntar o que se passa, tudo melhora. Li muitos textos de teatro. Consegui organizar um concurso de novas dramaturgias. Não parti muita loiça. E muitas vezes fui paciente, mas outras vezes não tive paciência para ser paciente. Assinei contratos e coisas importantes e não me senti melhor por isso. Desorientei-me e deixei de perceber para onde ia. Ainda não sei, mas já estou mais pacificada. Percebi que me questiono muito e que isso me impede de fazer muita coisa, nomeadamente escrever. Perdi a paciência. Fiquei muito bem disposta e não tive quem me acompanhasse. Fiquei muito mal disposta e não queria que ninguém me acompanhasse. Descobri que temos mesmo de viver sozinhos, a companhia a surgir, é um bónus. E não é culpa de ninguém. Ou é de todos. Comecei a usar cremes de beleza apropriados à minha idade e senti-me bem. Comecei a usar bases e pós e senti-me bem. Recebi um relógio de que estava à espera desde os 16 anos e fiquei muito feliz. Dei por mim cada vez mais cínica e descrente e a tentar contrariar isso, sem sucesso. Descobri que o tempo passa realmente muito depressa e quando nos apercebemos já perdemos o timing, os cremes não resultam, estamos mais cínicos, mais descrentes e ainda assim, por mais incoerente que possa parecer, continuamos a acreditar em recomeços.
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